Brasil, Colômbia e México se oferecem para mediar 'diálogo' e 'acordo' entre Maduro e oposição

Pessoas se manifestam em praça em Madri contra resultado eleitoral na Venezuela

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Manifestação em Madri contra resultado oficial da eleição na Venezuela.
  • Author, Mariana Schreiber
  • Role, Da BBC News Brasil em Brasília

Os governos do Brasil, Colômbia e México lançaram uma nota conjunta nesta quinta-feira (1/8) sobre as eleições na Venezuela, em que o presidente Nicolás Maduro foi declarado reeleito, mas enfrenta acusações de fraude eleitoral.

No texto, os três países reforçam a cobrança, já feita pelo governo brasileiro, de que as autoridades venezuelanas divulguem dados detalhados da votação de domingo (28/7), ao passo que também se oferecem "para apoiar os esforços de diálogo e busca de acordos que beneficiem o povo venezuelano".

A participação de Brasil, Colômbia e México como possíveis mediadores na crise venezuelana vem sendo ventilada por analistas desde a eleição no domingo, quando Maduro foi declarado ganhador pelo CNE (Conselho Nacional Eleitoral), derrotando Edmundo González, apoiado pela líder da oposição María Corina Machado, impedida de concorrer.

Os três são os maiores países da região governados pela esquerda. Tanto o governo brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva como o do colombiano Gustavo Petro já haviam enviado representantes para as negociações entre o chavismo e opositores que levaram à realização das eleições no ano passado. O México foi um dos mediadores na ocasião.

A nota divulgada na quinta não cita que formato teria esse eventual apoio ao diálogo na Venezuela.

Mais cedo, a líder da oposição Machado agradeceu ao Brasil por assumir a responsabilidade pela Embaixada da Argentina em Caracas, onde opositores estão abrigados desde março (leia mais abaixo), e também citou uma "negociação" respaldada pelo governo brasileiro.

"Isso [coordenação brasileira na embaixada argentina] poderia contribuir para avançar em um processo de negociação construtiva e efetiva como o Brasil tem respaldado", escreveu Machado no X, antigo Twitter.

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A declaração conjunta de Brasil, Colômbia e México pede ainda "aos atores políticos e sociais" "máxima cautela e contenção em suas manifestações e eventos públicos, a fim de evitar uma escalada de episódios violentos".

Desde a divulgação oficial dos resultados da eleição, protestos que tomaram as ruas da Venezuela.

A organização Observatório Venezuelano de Conflitos Sociais contabilizou mais de 300 manifestações em todo o país desde domingo. Destes, ao menos 115 foram reprimidos violentamente em 20 dos 23 Estados, segundo a organização.

Na quarta (31/7), o número de mortes causadas pela repressão aos protestos chegou a 12, segundo as ONGs Fórum Penal; Justiça, Encontro e Perdão e Laboratório de Paz.

Além das mortes, há relatos de centenas de pessoas presas — entre elas o líder do partido Vontade Popular, Freddy Superlano. O procurador-geral da Venezuela, Tarek William Saab, indicou que 749 pessoas foram detidas.

Maria Corina Machado disse que 115 destas prisões foram arbitrárias.

Por que Brasil se absteve em resolução da OEA

A nota conjunta não foi o único desdobramento diplomático da crise.

Na quarta-feira (31/7), a Organização dos Estados Americanos (OEA) rejeitou uma resolução sobre os resultados das eleições na Venezuela.

A decisão do Brasil de se abster contribuiu para o resultado, já que faltou apenas um voto para aprovação. A resolução teve 17 votos a favor, 0 contra, 11 abstenções e 5 ausências.

O países da região estão divididos em três grupos: os que dizem abertamente que houve fraudes na eleição (como Argentina e Chile), os que reconhecem a legitimidade da reeleição de Maduro (como Bolívia e Nicarágua) e os que cobram a divulgação de dados desagregados das mesas de votação para checagem do resultado (como Brasil, Colômbia e México).

Segundo apuração da BBC News Brasil, a decisão do Brasil de se abster foi tomada por conta de divergências em relação a um único ponto da proposta.

O trecho que impediu o acordo instava o Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela a atender a demanda da oposição e realizar uma verificação abrangente dos resultados "na presença de organizações de observação independentes para garantir a transparência, credibilidade e legitimidade dos resultados eleitorais".

Na visão do Itamarary, não caberia à OEA cobrar a supervisão por atores externos, já que, na visão do órgão, essa deveria ser uma iniciativa voluntária dos países.

Uma fonte a par das negociações ressaltou que países como Argentina e Uruguai não aceitam acompanhamento externo de suas votações.

Para a diplomacia brasileira, a resolução deveria apenas instar o CNE a publicar os dados desagregados de votação de modo a garantir a legitimidade, a credibilidade e a transparência do pleito.

Com isso, avalia o Itamaraty, os próprios atores políticos venezuelanos fariam a checagem do resultado.

Sediada em Washington, a OEA mantém uma relação conflituosa com o chavismo na Venezuela há muitos anos e tem seu papel contestado por vários líderes de esquerda latino-americanos, que acusam a organização de servir a interesses "imperialistas" dos Estados Unidos.

Após a eleição, o secretário-geral da OEA, o ex-chanceler uruguaio Luis Almagro, divulgou um comunicado acusando o governo venezuelano de fraudar a eleição e cobrando Maduro a "aceitar sua derrota eleitoral".

Na quarta (31/7), Almagro disse que pediria ao Tribunal Penal Internacional a prisão de Maduro por conta da repressão aos protestos na Venezuela.

Maduro ainda não comentou a fala de Almagro. No entanto, em fala também na quarta, o venezuelano disse que convocaria a população para uma "nova revolução" se "o imperialismo norte-americano e os criminosos fascistas" interferissem no país.

Manifestante mascarado em ato contra reeleição de Maduro na Venezuela

Crédito, Getty

Legenda da foto, Protestos tomaram as ruas de cidades venezuelanas após anúncio do resultado da eleição

Brasil assume embaixada argentina

O Brasil assumiu oficialmente nesta segunda-feira (5/8) a coordenação da representação diplomática da Argentina na Venezuela, incluindo seus bens e arquivos, a pedido do governo argentino, após Nicolás Maduro ter rompido relações diplomáticas com o país de Javier Milei e ter ordenado a expulsão dos diplomatas argentinos do país.

No momento, há ao menos seis nomes da oposição que estão abrigados na embaixada da Argentina, onde pediram asilo político. "Estamos protegendo os aliados da (Maria) Corina (líder da oposição). Isso tem que ter aceitação do governo Maduro", ressaltou uma fonte diplomática à BBC News Brasil.

Na semana passada, o presidente da Argentina, Javier Milei, agradeceu o Brasil por cuidar da missão.

"Aprecio muito a disposição do Brasil de cuidar da custódia da embaixada da Argentina na Venezuela. Também apreciamos a representação momentânea dos interesses da República Argentina e de seus cidadãos lá", disse Milei.

"Os laços de amizade que unem a Argentina com o Brasil são muito fortes e históricos", prosseguiu o argentino.

Milei afirmou que os diplomatas argentinos deixaram a Venezuela na quinta-feira (1/8) "como uma retaliação do ditador Maduro pela condenação que fizemos da fraude que perpetrou no domingo passado".

Além da Argentina, outros seis países tiveram seus diplomatas expulsos da Venezuela por contestarem o resultado eleitoral. Um deles é o Peru, cuja coordenação da embaixada também foi assumida pelo Brasil nesta segunda-feira.