Leitura Subjetiva Do Conto Pai Contra Mãe 2

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES


DEPARTAMENTO DE LETRAS
ÁREA: TEORIA DA LITERATURA
DISCIPLINA: TEORIA DA NARRATIVA (LET 0570 – 60h/a – 2021.1)
PROFESSOR: HENRIQUE EDUARDO DE SOUSA
ALUNO: BRUNO RADNER BEZERRA DE OLIVEIRA – MATRÍCULA: 20200150874

Leitura subjetiva do conto Pai contra Mãe, de Machado de Assis

O conto em questão me desencadeou sentimentos bastante conflitantes. No princípio,


parecia tratar de forma corriqueira, e de certo modo ácida, de um tema espinhoso – a
escravidão. À altura, considerei que fosse enveredar com ironia e finesse pela estrada da
denúncia; mas, então, comecei a sentir tamanha empatia e proximidade sentimental pelos
descaminhos da vida de Candinho e Clara.
Clara e Candinho me fizeram recordar bastante de meus avós, trabalhadores informais
que também penaram por sua subsistência, trocando sempre de casas alugadas e nunca
desistindo da família. O relato da vida desses personagens me transportou para a infância e
reavivou um sentimento nostálgico de quando ia visitar os meus familiares. Meus próprios
pais, casal jovem e compromissado com a missão de construir família, mudaram-se várias
vezes para casas alugadas nos primórdios da vida em comum.
Até então, a empatia que eu estava sentindo por este casal jovem que levava a vida
com sorriso no rosto mascarava o motivo da fonte de ganho de Candinho. Confesso que essa
questão ficou em segundo plano, embora o incômodo estivesse ali. Foi como se o texto nos
levasse mais para a construção de uma empatia por essa gente que tinha vida difícil nos
desviando do fato que havia gente de vida mais difícil ainda, que teria que recorrer à fuga de
seu cativeiro. Embora eu tenha me identificado pessoalmente com Candinho, pois
compartilhamos da dificuldade de se estabelecer profissionalmente, discordo fortemente dos
seus métodos.
O conto então nos conduz para um grande dilema moral: enfrentar a miséria, mesmo
com métodos obtusos, ou abrir mão da família tão esperada. Confesso que nesse ponto eu já
me sentia deveras incomodado com as parcas escolhas de ação. Tenho consciência da vida
difícil de uma família de classe baixa vivendo em condições instáveis, mas... e a dignidade
humana dos cativos? O clímax só agravou meu desconforto. Candinho dirigindo-se resignado
para entregar o filho, cobrindo-lhe de afeto, e encontrando a solução de seus problemas na
forma de uma mulher ainda mais desesperada que ele... não foi um final fácil de digerir.
Como ainda não sou pai, não posso me colocar em seus pés; porém, me chocou a facilidade
com que ele entregou para o suplício uma pessoa que se encontrava na mesma situação que
sua própria esposa alguns momentos antes.
Machado me surpreendeu, digo até de forma assustadora, ao recriar a imagem da
brutalidade do sistema escravista, imagem esta que a ternura da família salva não conseguiu
apagar. Não consegui sequer comemorar a felicidade de Candinho e Clara, pois já me
encontrava com um nó na garganta. Será mesmo que os fins justificam os meios? Eu não
conseguiria seguir o mesmo curso de ação de Candinho. Mas esta é a minha realidade e
mentalidade de alguém que hoje não tem filhos e entende que os seres humanos são iguais.
Posso assegurar, com toda certeza, que foi um dos textos mais difíceis que li, não pela forma
ou linguagem, mas por causa das sensações que provoca.

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