Bolinho de bacalhau

Bolinhos de bacalhau ou pastéis de bacalhau[1][2] são uma especialidade da gastronomia portuguesa,[3] sendo também muito populares em Angola[4] e no Brasil.[5]

Um prato com bolinhos de bacalhau.

No centro e sul de Portugal são conhecidos por pastéis de bacalhau e, no norte, por bolinhos de bacalhau.[1][2]

O pastel de bacalhau [nota 1] foi um dos candidatos finalistas às 7 Maravilhas da Gastronomia portuguesa.[3][6][7]

Origem geográfica

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Dentro de Portugal, é do consenso de historiadores gastronómicos portugueses, como Maria de Lurdes Modesto,[8] Maria Emília Cancella de Abreu[9] e Alfredo Saramago[10] que a receita tradicional do bolinho de bacalhau será originária da região do Minho.

História

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Ingredientes principais

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Sendo certo que se tem formado, na historiografia moderna, o consenso de que as batatas terão chegado a Portugal ainda no século XVI, provenientes da Galiza,[11] tendo sido primeiramente cultivadas em Trás-os-Montes,[12] passando subsequentemente para o Minho e Beiras[12] e mais tarde, também, para o vale do Sado.[13] Só posteriormente, em 1705, é que surge o primeiro registo comercial conhecido da compra de batatas, feito pelo Seminário de Viseu.[14] O historiador Mota Tavares defende que o facto de a batata se tratar de um cultivo de horta, à escala familiar, terá levado a que se fizessem poucos registos a seu respeito,[15] preterindo-se a sua importância até ao séc. XVIII.

Do que toca ao bacalhau, são escassos e incertos os registos anteriores, crê-se que o consumo do bacalhau terá começado em Portugal no século XIV, havendo registo de tratados de comércio entre Portugal e Inglaterra, em que Portugal trocava Sal por Bacalhau.[16] Contudo, foi só no século XVII que se generalizou o consumo de bacalhau em Portugal.[16]

Percursores

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As primeiras receitas escritas e compiladas que servirão de precursoras do pastel de bacalhau despontam já no séc. XIX, mas será só no início do séc. XX que a receita se começa a consolidar naquilo que é hoje em dia.[17][18]

Com efeito, em 1795, a Academia das Ciências entrega a medalha de ouro a D.ª Teresa de Sousa Maciel, e outros reconhecidos botânicos da época, pela sua frutuosa produção de batata, em Vilarinho de São Romão.[19][20] Terá sido o filho desta, o visconde de Vilarinho de São Romão, quem publicará em 1841, no tratado culinário intitulado « Arte do Cozinheiro e do Copeiro», a primeira receita, sob o nome de «Bolinhos de bacalhau» contudo, convém salientar que esta se aproximava mais do conceito moderno das pataniscas.[20][8]

Sucedem-lhe outras receitas, com pequenas variações, denominadamente os «pastelinhos fritos de bacalhau à holandeza» e «pastelitos de bacalhau», mencionados em 1876, na obra «Arte de Cosinha» de João da Matta, se bem que a primeira receita se destacava por conter queijo ralado[20][8] e a segunda, por não ser frita, mas antes por se cozer no forno.[8][9]

De 1889 e 1908, volta a ressurgir com o nome «bolos de bacalhau» nos menus da família real portuguesa, embora não conste relato da sua forma de confeccção.[21]

A alusão à fritura dos pastéis de bacalhau à portuguesa só surge numa receita compilada numa publicação oficial de 1903, da autoria de J.M. Sousa Pereira, intitulada «A Cozinha Moderna».[8][9] Todavia, esta receita distância-se da concepção moderna de pastel de bacalhau, porquanto a fritura era feita em banha de porco.[8][9]

Receita moderna

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A primeira receita moderna do bolinho de bacalhau aparece compilada em 1904, no livro «Tratado de Cozinha e da Copa», de Carlos Bandeira de Melo, sob o nome de «bacalhau em bolos enfolados».[20]

Carlos Bandeira de Melo tratava-se de um oficial do exército português, que usava o pseudónimo Carlos Bento da Maia.[22]

 
Bolinhos de bacalhau caseiros.

Apesar de indicar o modo de preparo e os ingredientes, o autor foi omisso em relação à proporção dos ingredientes, no entanto, esta descrição serviu como base para as variações da receita existentes até os dias de hoje.[22]

 
Bacalhau seco.

Variantes

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Em França, reputa-se uma origem guadalupenha (na língua indígena da ilha são acras) para esta receita, sendo que os pastéis são ligeiramente picantes.

Na Catalunha[23] são muito populares, não contêm picante e costumam ser fritos em azeite. Em ambos os lugares, são feitos com bacalhau demolhado e desmigado (exqueixat) misturado com uma massa típica de pasteis (água ou leite, farinha, ovos) juntando alho, salsa e às vezes também cebola picada. Também se costumam comer como aperitivo ou petisco, em pratos de frituras variadas ou como acompanhamento em pratos combinados. A esta variante com massa de farinha, em Portugal, chama-se patanisca ou isca de bacalhau.

Recentemente têm surgido em Portugal, versões mais criativas do tradicional petisco, como pastéis de bacalhau recheados com queijo da Serra da Estrela.[24][25]

Pastel de bacalhau brasileiro

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No Brasil também pode ser encontrada uma variante que apesar de ter o nome de "pastel de bacalhau", similar ao nome utilizado em parte de Portugal e nos PALOP para o bolinho de bacalhau, é ligeiramente diferente, se referindo a um pastel semelhante à empanada latino-americana que consiste de uma massa recheada com algum ingrediente e frita, neste caso específico, com recheio de bacalhau.[26]

Notas

  1. Apesar de o artigo referenciar no seu todo a denominação "bolinho", neste caso figura "pastel" pois foi o nome dado ao prato na atribuição da candidatura.

Referências

  1. a b «Receita de Pastéis de Bacalhau - 1001 Receitas de Bacalhau». www.1001receitas.com. Consultado em 15 de junho de 2010 
  2. a b «Pastéis de Bacalhau - Lifecooler - RTP». estilosdevida.rtp.pt. Consultado em 15 de junho de 2010 
  3. a b «21 Finalistas». 7 Maravilhas da Gastronomia - Pastel de Bacalhau. Consultado em 10 de setembro de 2011 
  4. «Bacalhau é produto de luxo em países lusófonos - JN». jn.sapo.pt. Consultado em 15 de junho de 2010 
  5. «Bacalhau, a história de um alimento milenar». bacalhau.com.br. Consultado em 15 de junho de 2010 
  6. Alves, João. «Pastel de Bacalhau». 7 Maravilhas de Portugal. Consultado em 5 de agosto de 2023 
  7. «Portugueses escolhem as 7 Maravilhas da Gastronomia nacional». Jornal SOL. Consultado em 5 de agosto de 2023 
  8. a b c d e f Modesto, Maria de Lourdes (2012). Cozinha tradicional portuguesa. Augusto Cabrita, Cardoso Homem. [Lisboa]: Verbo. 360 páginas. ISBN 9789722230896. OCLC 882923500 
  9. a b c d «Pastéis de Bacalhau». historiabacalhau.pt. Consultado em 3 de janeiro de 2023 
  10. Saramago, Alfredo (dezembro de 2000). Cozinha do Minho : enquadramento histórico e receitas. Inês Gonçalves. Lisboa: [s.n.] OCLC 1192535001 
  11. Mota Tavares, Pedro (Junho de 2020). «Cultivo e consumo da batata em Trás-os-Montes: impactos socioeconómicos nos séculos XVIII-XIX» (PDF). Centro de Estudos da População Economia e Sociedade. População e Sociedade. 33: 65-78. Consultado em 5 de janeiro de 2023 
  12. a b Pedro Rau. «Um vegetal com história... e com muita vitamina!». Consultado em 13 de junho de 2019 
  13. Pedro Ribeiro (30 de abril de 2008). «A lógica da batata». Consultado em 13 de junho de 2019 
  14. Oliveira, João Nunes de (2010). «Entre a Tradição e Inovação. A Agricultura da Beira Alta nos séculos XVIII e XIX». Revista portuguesa de história (41): 73–103. ISSN 0870-4147. Consultado em 5 de janeiro de 2023 
  15. Mota Tavares, Pedro (Junho de 2020). «Cultivo e consumo da batata em Trás-os-Montes: impactos socioeconómicos nos séculos XVIII-XIX» (PDF). Centro de Estudos da População Economia e Sociedade. População e Sociedade. 33: 65-78. Consultado em 5 de janeiro de 2023 
  16. a b Marques, Fernando (Dezembro de 1997). «História do Bacalhau». Direcção Regional da Agricultura e das Pescas. Consultado em 16 de abril de 2023 
  17. Aranha, Francisco (1942). A Batata. Lisboa: Editorial Império. 267 páginas 
  18. «Consumidor – História – PorBatata». Consultado em 3 de janeiro de 2023 
  19. Teixeira Rebelo da Silva, José Alberto (2015). A Academia Real das Ciências de Lisboa (1779-1834): ciências e hibridismo numa periferia europeia (PDF). Lisboa: Universidade de Lisboa. p. 365. 413 páginas 
  20. a b c d «Todos lhe chamam seu». PÚBLICO. Consultado em 3 de janeiro de 2023 
  21. Menus da Família Real : colecção do Museu-Biblioteca da Casa de Bragança. Maria de Jesus Monge, Marta Páscoa, Virgílio Nogueiro Gomes. [Lisboa, Portugal]: Fundação da Casa de Bragança. 2019. pp. 98–105. ISBN 978-989-8410-86-3. OCLC 1126340230 
  22. a b Carlos Lessa, Os Lusíadas na Aventura do Rio Moderno
  23. «Berço do festejado chef Ferran Adrià, região espanhola celebra seu Ano da Gastronomia; veja os pratos típicos de cada Província - Turismo, Cultura e Lazer - ETUR -». www.etur.com.br. Consultado em 15 de junho de 2010 
  24. Pasteis de Bacalhau com Queijo. gastroportugal.com. Consultado 18 Setembro 2021.
  25. Coelho, Sara Otto. «Depois da polémica em Lisboa, os pastéis de bacalhau com queijo da serra chegam ao Porto». Observador. Consultado em 5 de agosto de 2023 
  26. «Pastel de bacalhau». Brasilsabor. Consultado em 17 de setembro de 2011 
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Este áudio foi criado a partir da revisão datada de 6 de julho de 2011 e pode não refletir mudanças posteriores ao artigo (ajuda).

Ligações externas

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